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Estamos na COP-30 discutindo adesão de países a compromissos; isso é frustrante, diz diretor da MRV

O diretor executivo de Relações Institucionais e Sustentabilidade do Grupo MRV, Raphael Lafetá, avalia que é preciso mais ação para tratar dos assuntos de mudanças climáticas. Ele destaca que na COP-30, por exemplo, ainda se discute se um país vai aderir ou não a compromissos. “Isso é cansativo e frustrante. Os desastres ambientais estão aumentando.”

Para o executivo, a fase, agora, é de implementar ações e fazer acontecer. Além de detalhar como a sustentabilidade faz parte das operações da construtora MRV, Lafetá explica como o planejamento, na prática, conseguiu salvar um empreendimento do grupo durante o desastre climático no Rio Grande do Sul. “Em um empreendimento nosso na região, os estudos mostraram que era necessário elevar o terreno em dois ou três metros. Fizemos isso e, na enchente, esse empreendimento foi o único na área que não foi alagado.”

Leia a seguir trechos da entrevista, disponível na íntegra em vídeo acima.

O Grupo MRV tem a sustentabilidade como um pilar central da sua estratégia ou ainda como algo em construção?

Sustentabilidade não é mais uma opção. É um tema que deve estar enraizado e ser uma base de sustentação das ações de todas as empresas. Na MRV, somos líderes de mercado em sustentabilidade há mais de uma década. Desde a criação da empresa, nosso fundador, Rubens (Menin), junto com o primo dele, Mário (Lucio Pinheiro Menin), pensaram em ter um negócio sustentável em todos os aspectos. Na década de 1980 e 1990, quando a MRV ainda era pequena, as ações eram mais limitadas, e o mundo não urgia por questões que hoje estão muito latentes. Mas as nossas decisões sempre levaram em conta os três pilares da sustentabilidade: social, ambiental e ético. O produto em si já é socialmente responsável — habitação digna de interesse social. No ambiental, buscamos preservar e mitigar impactos. E na postura ética, temos rigor em todas as relações. Sustentabilidade está no corpo da empresa.

Quais ações práticas demonstram essa prioridade na sustentabilidade?

Muita gente fala de sustentabilidade de forma romantizada. Gosto de comparar com a busca pela qualidade na década de 1980 e 1990. Naquele período, qualidade era questão de sobrevivência para as empresas. Hoje, sustentabilidade tem a mesma importância. Ela deve estar dentro das operações. No aspecto ambiental, por exemplo, temos um software inteligente para avaliar terrenos antes da compra. Ele analisa segurança hídrica, riscos de inundação, deslizamentos, impactos ambientais no entorno e na bacia hidrográfica. No social, o projeto Escola Nota 10, por exemplo, já alfabetizou mais de 5 mil alunos em nossos canteiros e foi reconhecido pela ONU, além de ter ganho este ano um prêmio em Cannes. Na governança, conquistamos o Prêmio Pró-Ética pela terceira edição consecutiva. Seguimos rigorosamente princípios éticos com colaboradores, fornecedores e clientes.

Esse software de avaliação de terrenos foi desenvolvido pela própria MRV?

Sim. Desenvolvemos internamente com apoio de um parceiro externo. Ele reúne diversas plataformas que analisam relevo, curva de enchentes, nível de chuvas, escassez hídrica e declividade do terreno. Com isso, conseguimos definir se um terreno é adequado para empreender ou se deve ser preservado, virando praça, espaço verde ou área pública.

Como funciona a definição dos investimentos em ESG na empresa?

Todo investimento precisa ter retorno. Um exemplo claro foi a tragédia recente no Rio Grande do Sul. Em um empreendimento nosso na região, os estudos mostraram que era necessário elevar o terreno em dois ou três metros. Fizemos isso e, na enchente, esse empreendimento foi o único na área que não foi alagado. Também destinamos 1% do lucro líquido da companhia para o Instituto MRV, investimento social privado direto, não incentivado. O objetivo é fomentar educação e projetos que beneficiem crianças e adolescentes, prevenindo vulnerabilidades e até o ingresso no crime. Temos ainda investimentos ambientais, como os R$ 11 milhões destinados ao plantio de mais de 320 mil árvores, além de estudos de redução de emissões no Escopo 3, que representam 95% das nossas emissões.

Essas árvores são plantadas onde?

Nos cinco biomas brasileiros, já que a MRV atua em todas as regiões do País. Plantamos árvores para tornar o entorno mais agradável, criar amortecimento ambiental e, em parceria com municípios, recuperar áreas degradadas ou encostas. Sempre buscamos respeitar a característica local.

Como está o setor da construção civil em relação à sustentabilidade?

Nos últimos dois anos, esse tema ganhou mais força. Hoje já se fala em financiamento verde, com grandes fundos e investidores avaliando a postura sustentável das empresas. Isso cria uma cobrança semelhante ao que houve com certificações de qualidade na década de 90. Os grandes fornecedores, como aço e cimento, estão se movimentando. O aço verde (fruto de uma produção que emite menos carbono), por exemplo, já é competitivo e procurado mundialmente. No cimento, há esforços para reduzir emissões. As empresas também incorporam soluções sustentáveis nos empreendimentos, como sistemas de reuso de água, descargas com dois estágios, energia limpa e placas solares, levando benefícios para os clientes finais.

Quando falamos de moradias dignas, também falamos de urbanização adequada, certo?

Exato. Temos de considerar mobilidade, transporte público, áreas de risco e a integração dos bairros. Infelizmente, planos diretores de algumas cidades, por falta de visão, espalharam a população e dificultaram a mobilidade urbana. Hoje, vemos ruas congestionadas e deslocamentos caóticos. Uma cidade mais adensada e bem planejada reduziria esses problemas. Mas isso exige agilidade do poder público na aprovação de projetos. A burocracia acaba incentivando ocupações irregulares, porque as pessoas não vão esperar anos por soluções.

Há bons exemplos no Brasil?

Sim, Maringá, no Paraná, é um ótimo exemplo. A cidade criou os Conselhos de Desenvolvimento Estratégico Sustentável (Codeses), reunindo sociedade civil e diferentes setores para pensar a cidade de forma sustentável. Com diálogo e participação, Maringá mostra que é possível planejar melhor, mesmo sendo uma cidade de porte médio.

Quais são os principais gargalos que precisam ser superados nos próximos anos no setor da construção civil?

Temos desafios tecnológicos, como substituir equipamentos movidos a diesel por elétricos. Isso exige avanços na produção de baterias e na escala de mercado. Outro problema importante é normativo. Falta padronização em normas habitacionais, principalmente para imóveis de interesse social. Hoje, cada município define regras diferentes para tamanho de apartamentos, janelas, ventilação, acústica e assim por diante. Isso dificulta a industrialização do setor, que reduziria custos, desperdícios e uso de recursos naturais. Além disso, cada Estado tem exigências distintas de seus corpos de bombeiros, complicando ainda mais a padronização. Falar que a janela tem de ter certa dimensão no município e no outro tem de ter outra dimensão, isso não tem muita lógica e atrapalha muito a eficiência e a sustentabilidade. Em tese, para não ter ocupação errada das cidades é preciso acelerar a ocupação ordenada. Você acha que a burocracia do órgão público não tem nada a ver com o clima? Se você fizer a junção são coisas totalmente interligadas.

E qual a importância da COP-30 para a MRV?

A COP-30 sendo realizada no Brasil, em Belém, é uma oportunidade única. O Brasil é um dos países mais sustentáveis do mundo, com matriz energética limpa e vastos recursos naturais preservados. É hora de mostrar isso ao mundo. Queremos também levar o debate sobre moradia digna e acessível como parte fundamental da sustentabilidade. Isso inclui desde a escolha do terreno até a entrega e uso do empreendimento. Além disso, vamos tratar de financiamento verde, mostrando a importância de bancos e fundos fomentarem empresas com compromisso ambiental e social.

O que você, como cidadão, espera da COP-30?

Espero responsabilidade dos líderes mundiais. Não dá mais para ficar apenas no campo das ideias. Precisamos de ação. Estamos na COP-30 ainda discutindo se um país vai aderir ou não a compromissos, isso é cansativo e frustrante. Os desastres ambientais estão aumentando. Se parte disso for cíclica, ainda temos tempo de minimizar os efeitos. Mas é comprovado que as emissões de gases de efeito estufa aquecem o planeta. Minha esperança é que a COP-30 seja um divisor de águas, com decisões concretas para garantir um futuro melhor para 2030 e 2050. A gente vê o clima de algumas cidades pior do que outras, e algum motivo tem, é porque interferimos no clima de alguma forma. Você vê rios que são secos, e quando você vai ver lá na origem, há uma intervenção incorreta do empreendedor e se a intervenção fosse correta, o rio ainda estaria lá. Não estou falando que não tem de intervir, mas tem de fazer a intervenção correta. Temos de ir para o campo das ações, tem de ir para o campo da ‘fazeção’. Precisamos tomar ação. Essa é a minha esperança para a COP-30.

Fonte: Site Oficial Terra

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